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Psicóloga clínica que realizou por 10 anos atuação na Saúde mental da PBH e atualmente dedica aos atendimentos particulares. Participa de artigos nas Revistas Vox objetiva e Tendência Inclusiva. Realiza palestras e entrevistas na mídia impressa e televisiva.

sábado, 15 de outubro de 2011

Participei desta excelente reportagem da Revista Vox...Leiam!!  Muitas orientações aos Pais:


CRIANÇA SEM CONTROLE, ADULTO FRACASSADO

Fernanda Carvalho

Pesquisa revela: crianças que aprendem a lidar com frustrações tendem ao sucesso na escola e na vida profissional

O teste é simples, mas esclarecedor. À frente de uma criança sentada à mesa, um grande marshmallow. Ela pode comer na hora ou esperar alguns minutos e ganhar outro doce como recompensa. O experimento Marshmallow Stanford levantou a hipótese, já na década de 1960, que o autocontrole, mostrado em frente a uma simples guloseima, pode ser importante para o desenvolvimento escolar e profissional. Algo que foi comprovado agora por um amplo estudo baseado em 30 anos de observação e realizado em um dos maiores centros de neurociência do mundo, a Universidade de Duke, da Carolina do Norte, nos Estados Unidos.

A pesquisa coordenada por Avshalom Caspi e Terrie Moffitt, psicólogos estudiosos de saúde mental e desenvolvimento humano, acompanhou 1036 pessoas de todos os subgrupos, da infância à fase adulta. Os testes realizados com crianças associaram habilidades de autocontrole à riqueza e antecedência criminal na idade adulta, independentemente do nível de inteligência ou da classe social familiar. O que significa que os pequenos que não sabem lidar com frustrações tendem a apresentar uma série de comportamentos mais agressivos e a não terem sucesso profissional. Em contrapartida, aqueles que desenvolvem um bom autocontrole e sabem lidar com os percalços da vida se tornam profissionais de sucesso, mais controlados e menos impulsivos. Não se trata de inteligência.

A especialista em psicopedagogia, Sandra Soledade, explica que, em princípio, para a criança não existem regras. A sociedade e a família, como primeira instância, trabalham essas leis. Quando a criança percebe que nem sempre vai conseguir o que quer, ela começa a aprender a lidar com a frustração e a ter autocontrole. “Quando ela está em uma sala de aula, brincando com os coleguinhas, às vezes ela desejará o brinquedo da outra criança. Ela vai, então, entender que não poderá simplesmente tomar o objeto das mãos da outra criança. Terá que negociar. Isso é um aprendizado pra vida”, exemplifica.

Desde que a irmã mais nova nasceu, M.C., 10 anos, começou a se comportar de forma diferente. Segundo o pai, a menina passou a ter comportamentos de “mocinha” e tinha dificuldade de entender os limites. Não tinha controle, não sabia conversar direito e ficava irritada por coisas simples. “Eu acho que os atritos começaram mais por causa dos ciúmes da irmã. O porquê dessa intensidade, eu não saberia falar. Não sei a quem ela puxou, mas não acho que seja genético”, analisa.

Pesquisas já esclareceram que o autocontrole é parcialmente herdado e, em parte, aprendido. Segundo a psicóloga Maria Angélica Falci, crianças que têm uma boa base na formação aprendem a ter autocontrole. “A pessoa que se autocontrola é aquela que possui uma boa formação emocional. Ela sabe distinguir o que é certo do que é errado. Além disso, busca qualidade de vida, sabe se relacionar, tem vida social, afetiva, profissional, espiritual, em andamento e de forma ativa”, explica Falci.

Com o início do tratamento psicológico, M.C. já está melhorando. De acordo com o pai, hoje a menina consegue dialogar melhor, se abrir e está mais carinhosa. “Eu não estou brigando mais com a minha família”, relata M.C.

Esse é justamente o grande debate que emerge da descoberta: já que o autocontrole é um forte influenciador da vida futura. Como fazer com que crianças aprendam a lidar com frustrações e a ter mais autocontrole?

Sandra Soledade explica que uma das formas de ensinar o autocontrole pode ser aprendida na escola, por meio de jogos onde os pequenos são colocados na posição de negociadores para conseguirem o que desejam. Assim aprendem as regras. “Em casa também é importante que existam combinados na família”, acrescenta a psicopedagoga.

As pesquisas mostram. Alguns dos mais eficazes programas são aqueles envolvendo treinamento de pais. Segundo Maria Angélica, a formação familiar, a atenção dos pais, influencia na formação emocional, na autoconfiança e na segurança. “Em relação à frustração, existe uma pesquisa sobre o estresse infantil que mostra que crianças cujos pais não possuem muito interesse, não dão atenção, tendem a buscar uma forma de compensação, por exemplo, na alimentação em excesso”, expõe.

De acordo com o psicólogo e doutor Dave Walsh, autor dos livros No – Não - e Smart Parenting, Smarter Kids ou Pais espertos, filhos mais espertos, um dos princípios básicos desenvolvidos pelo cérebro é que ele se torna bom nas ações constantemente repetidas. “Se uma criança não desenvolve autocontrole, então é difícil para ela conseguir atrasar gratificações, ser paciente, perseverante e controlar seus impulsos quando for adulto”, afirma Walsh.

Já um estudo realizado pelos criminologistas Alex Piquero, Wesley Jennings e David Farrington concluiu que mais pessoas com autocontrole iriam conduzir a melhores decisões em vários domínios da vida social: menos uso de drogas, melhor educação e emprego e menores índices de criminalidade. Segundo Piquero, por meio do desenvolvimento do autocontrole no início da vida, as crianças tenderiam a experimentar resultados positivos. “Existem vários programas de intervenção, mas a maior parte implicará em ajudar pais e filhos em como exercitar autocontrole, tomar as melhores decisões cedo na vida e focar nos custos das ações mais do que nos benefícios”, explica.

Para Terrie Moffitt uma das estratégias seria o treinamento dos pais, visando a melhor educação das crianças. Assim como Soledade, Moffitt acredita que outra tática seria fazer intervenções em escolas-base para professores em sala de aula ou até mesmo em programas de televisão. “Vila Sésamo é uma atração em que os fantoches modelam como economizar dinheiro para um objetivo futuro e resistir à tentação da compra impulsiva”, exemplifica a pesquisadora.

Não é à toa que a psicologia e a psiquiatria infantis estão em alta. O número de crianças com problemas de ansiedade, angústia e depressão cresce a cada dia. Maria Angélica enfatiza que a situação é assustadora. Segundo a psicóloga, isso acontece em função da modernidade, do estresse contemporâneo e dos pais que tentam barganhar o afeto com questões materiais. E é justamente a partir desses problemas originários da infância que o autocontrole pouco ou nada se desenvolve, a ponto da pessoa passa a agir, em algumas situações, por impulso, sem leis. “São frutos do abandono, da exclusão. Quando não existem regras, a pessoa age por instinto, como se nada fosse atingi-la e tudo pudesse ser experimentado”, esclarece a psicóloga.

Gerações

Não há dúvidas de que a criação familiar passou por uma grande transformação. Basta observar como as famílias se comportam. Provavelmente você conhece pelo menos uma criança que manda em boa parte da família e que não tem limites. E com certeza já ouviu seus pais ou alguém dizer, ao menos uma vez, algo como “Era só meu pai olhar para mim, não precisava falar nada, eu já obedecia”.

De acordo com Sandra Soledade, algumas famílias estão com dificuldade em lidar com a frustração. “Os pais passaram a um extremo oposto, porque ele pensa ‘Não quero ser esse pai autoritário que eu tive’. Passou a ser aquela laissez-faire de permitir tudo e, com isso, as crianças pensam ‘Se eu posso, eu vou fazer. Se eu não recebi a norma, eu vou fazer’”, ilustra a psicopedagoga. Para Soledade, as pessoas começam a criar estratégias para fugir das frustrações fazendo provas de vestibular apenas em faculdades particulares ao invés de lutarem por universidades de grande prestígio, concorrência e dificuldade, por exemplo. Optam pelo caminho mais fácil.

Dave Walsh explica que o “não” é uma boa estratégia. “Dizendo ‘não’ quando precisamos dizer, nós ajudamos as crianças a aprender as habilidades da autodisciplina”, explica. Na concepção de Walsh, quem conta a história é quem define a cultura. Segundo ele, atualmente as histórias são contadas pela televisão, pelo videogame, pelo computador e isso provoca uma epidemia que ele nomeia Transtorno de Déficit de Disciplina – o “TDD”, cujos sintomas incluem desrespeito, impaciência, uma necessidade de gratificação instantânea, expectativas infladas e consumismo fora de controle. “Se não tratado, o TDD vai produzir, espiritualmente e psicologicamente, crianças fracas. É por causa disso que a autodisciplina é um fator chave para o sucesso futuro”, alerta.

As pesquisas são muitas e esclarecedoras. O autocontrole é o maior preditor de sucesso. Ao mesmo tempo, pais e filhos estão na contramão. Está lançada a batata-quente nas mãos de educadores e, porque não, dos governantes.

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